A Aurora do Coaching Psicológico na Decadência da Sociedade Instantânea

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Durante os últimos anos tenho assistido a um aumento exponencial, na procura da certificação e validação relativamente à abordagem de Coaching, em solo português. Considero alarmante o facto de que toda a gente, que se acha portadora de conhecimento de capital empresarial, pense que é capaz de trabalhar o capital humano, com a mesma mestria e mensuração com que avaliam questões práticas. Contudo, o termo Coach, na sua génese etimológica, retrata aquele que “orienta, que “guia” ou “conduz”, tal como se tratasse de uma carruagem medieval, que carrega as pessoas, confortavelmente, numa boa direção. O Coaching será então esse processo de transporte, que promete conduzir as pessoas ao destino desejado.

O que era o objecto Coach (carruagem), produto do melhor ornamento e conforto, transformou-se no homem/mulher Coach, produto da melhor indumentária e habilidade comunicativa. Sim, a melhor habilidade comunicativa, porque todas as pessoas gostam de desfrutar uma viagem existencial, na distração do melhor entretenimento.

Durante o processo de Coaching, o Coach deve estar revestido das melhores ferramentas ou, como quem diz, ter os cavalos mais velozes e as rodas mais resistentes, para que a viagem seja rápida e segura, para que a enorme quantia despendida, se torne redundante em comparação com os ganhos obtidos.

Ao longo deste processo, as rédeas das sessões são tomadas directivamente pelo Coach, sendo que o Coachee (cliente) reflete acerca das suas direções, dos seus objetivos e planeamentos. Por vezes, se o Coachee estiver desorientado, o Coach irá facultar um mapa, ou uma roda da vida, para que o Coachee reflita bem sobre o seu panorama e itinerário. Nem é preciso refletir muito por onde circulou outrora, apenas deve refletir sobre um período recente e se possível no presente, como se os trajetos antecedentes não definissem o nosso gosto pelo trajeto subsequente.

Algumas vezes terá de parar pelo caminho, mas não se preocupe! O Coach irá facultar-lhe os melhores métodos de networking para que ‘Nunca Almoce Sozinho’. Afinal, se todos somos potenciais aranhas, todos iremos tecer teias duradouras, com as ligações mais resistentes e estreitas, para nunca desabarmos da networking que acabamos de construir. Atendendo ao pressuposto que todos possuímos esse mesmo potencial, não importa se gosta de ficar no centro da carruagem a vociferar extrovertidamente ou, por outro lado, se prefere ficar no canto recatado à espera que alguém puxe por si, porque a carruagem pode ser somente uma, mas com todos os extras que detém, gadgets e técnicas não irão faltar para o moldar, mesmo que se repitam por vezes as mesmas.

No mundo do instantâneo, onde a transformação da pessoa não precisa surgir das entranhas, mas sim da máscara social que carrega, não existe tempo nem paciência para grandes viagens que pisem caminhos incógnitos. Desta forma, as carruagens evoluem para comboios a vapor, de vapor para elétricos, depois aprimoramos as velocidades até encontrarmos o Alfa. O Alpha que todos almejamos ser em casa, no trabalho, nas disputas com os amigos, nos relacionamentos amorosos, etc., e é para isso que procuramos os melhores especialistas, visando essa transformação instantânea. Numa existência onde se pretende que a esperança de vida cresça e que a saúde seja a pedra basilar, tencionamos a vivê-la menos intensamente e de modo fugaz. Na sociedade instantânea é imputável então, negligenciarmos quem somos e muito menos pretendermos procurar especialistas obsoletos, que espelham o nosso verdadeiro ser, porque já nem o reconhecemos, deixa de ser familiar e está emaciado. Existem veículos que nos podem conduzir a esse reconhecimento, todavia tempo, coragem e indagação pelo Eu verdadeiro, é algo que não coaduna com a sociedade instantânea.

Essa indagação que era bem conseguida através da psicologia, porém, esta parece que não abre l’appétit pour la société contemporaine. Ao longo do tempo a própria psicologia foi se dividindo em várias correntes psicológicas, tal como um grupo variado de trens que aguardam nos diferentes cais de partida para viajar, por exemplo, em torno das questões da líbido sexual, da ótica positiva sobre o humano ou pelas questões da finitude. A ambivalência psicológica, poderá ter afastado o indivíduo do instantâneo das suas linhas férreas, porque a existência parece agora ser feita de empowerment e não da compreensão profunda do si mesmo. Desta forma, linhas em desuso tornam-se arcaicas, até que o vintage ressuscite o valor das coisas passadas, mas desejo que a psicologia nunca perca a sua essência e, quem faz da psicologia arte e ciência, são os seus motoristas.

Contudo, existe uma nova aurora que se tem anunciado como resposta à bruma instantânea existencial. Essa aurora evoca um acasalamento de dois métodos distintos. Um que se foca na pessoa e outro que estratifica técnicas de emancipação perante a sociedade instantânea. Espero que do cruzamento destas duas engrenagens (psicologia + Coaching), surja um híbrido, que não se perca nas técnicas do Coaching e que seja capaz de atender às pessoas. No final, se o percurso culminar em terreno pantanoso, pode ser que este híbrido forneça ao sujeito, a resiliência e sentido de existência, para sobreviver além-fronteiras do seu conhecido trajeto habitual.

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