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A justiça restaurativa em Portugal

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Por Rafael Gonçalves Fernandes
Criminólogo

O sistema tradicional de justiça encara o crime como um conflito entre o Estado e o autor do crime. Como tal, quando ocorre um crime, o Estado retribui com a aplicação de uma pena de prisão ou de multa.

A justiça restaurativa que irá ser abordada neste artigo traz consigo uma perspetiva diferente, de como dar resposta a um crime. Esta corrente é relativamente recente, surgiu em meados da década de 1970, devido aos crescentes fracassos da justiça retributiva.

A justiça restaurativa, como o próprio nome indica, tem um carácter restaurador, pois pretende restaurar na vítima o dano causado pelo infrator e, como tal, coloca estes dois intervenientes no centro do processo, de modo a satisfazer ambas as partes.

Como exemplo de justiça restaurativa em Portugal, temos a mediação penal introduzida pela Lei nº 21/2007. Este mecanismo tem aplicabilidade nos denominados crimes privados e semipúblicos, com pena de prisão máxima não superior a cinco anos, desde que não se trate de crime de liberdade e autodeterminação sexual, corrupção, tráfico de influências ou peculato, e que a vítima não tenha idade inferior a 16 anos.

Este mecanismo só tem lugar quando a vítima e o arguido o requerem perante o Ministério Público. A partir do consentimento das partes, é nomeado um mediador imparcial, que em trabalho com ambas tenta formular um acordo escrito que visa responder aos danos causados pelo crime. A mediação penal tem um prazo máximo de três meses, que pode ser prorrogado no limite até dois meses. O arguido e a vítima têm a possibilidade de anular a mediação a qualquer altura da mesma. A assinatura do acordo implica que a vítima desista da queixa e que o arguido não se oponha ao acordo. Todavia, a vítima, se verificar que o acordo não está a ser cumprido, pode renovar a queixa no prazo máximo de um mês.

Crimes como furto simples, ofensas à integridade física simples, ameaça, coação, injúria, difamação, violação do domicílio, entre outros, podem ser resolvidos através da mediação penal. Segundo as estatísticas da Direção Geral da Política de Justiça (DGPJ), desde 2007, ano em que este mecanismo começou a ser utilizado em Portugal, até 2016, foram mediados um total de 803 processos criminais. Contudo, a partir de 2017 as estatísticas mostram um total de zero casos mediados, apesar de efetivamente ter havido casos de mediação só que inferiores a três anualmente e por questões de segredo de justiça não são publicados estaticamente os dados.

Infelizmente, conclui-se que a mediação penal não teve grande eficácia em Portugal. No início verificou-se uma elevada utilização que foi decrescendo ao longo dos anos, o que se traduz numa lamentável situação, pois a mediação penal propicia vários efeitos positivos. Possibilita a vítima confrontar o arguido relativamente aos danos que este lhe causou, pode demonstrar ao arguido como a sua vida foi afetada pelo crime ocorrido, conhecê-lo verdadeiramente, perguntar ao arguido o porquê de ter praticado tal ato, entre outras.

Possibilita ao arguido assumir a responsabilidade pelo seu ato, consciencializar-se dos danos que causou à vítima, pedir desculpas, proporcionar uma justa reparação dos danos e promover a sua ressocialização. Propicia à sociedade uma aproximação e participação na realização da justiça e reduz o impacto da pena de prisão na comunidade. Beneficia ainda a administração de justiça, pois reduz os custos da dita máquina judicial, reduz os custos com a reclusão dos arguidos, reduz o tempo de resolução dos processos criminais, reduz a quantidade de processos pendentes de julgamento e promove perante a população uma maior consciencialização do sistema de justiça.

 

Fontes:

Direção Geral da política de Justiça

Lei n.º 21/2007, de 12 de Junho

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