Mais do que celebrar o 25 de Abril, Vila Verde assinalou, esta manhã, uma das maiores conquistas da revolução dos cravos, as liberdades de expressão (cultural e política e de associação), o Poder Local. E o Vade, que acolheu as comemorações do 48º aniversário do dia da Liberdade, esteve à altura de tal desiderato. Crianças, jovens e adultos – por si só, ou integrados nas coletividades locais – expressaram-se de diferentes formas. Souberam interpretar as palavras do presidente da assembleia municipal, Carlos Arantes: «Devemos evocar todos os dias os ideais / valores de Abril».
Neste tom, o presidente de junta local e também deputado, Carlos Cação, deu o mote: «O Vade é uma terra com vida!».
E foi ao som das concertinas, da mais genuína expressão do nosso povo, que se iniciaram as comemorações, assentes no bonito tapete que vincava a comemoração descentralizada do 25 de Abril no Vade. O povo, com a sua arte e a sua cultura muito caraterísticas, foi o centro da atividade. Até os tradicionais discursos, o mais enfadonho momento de todas as celebrações, ficaram para segundo plano, sem que seja importante anotar que é igualmente uma imprescindível liberdade, outro tipo de expressão mais formal.
A completar o ramalhete de tão importante momento, não foram esquecidos aqueles que souberam lançar e consolidar as sementes do Poder Local durante este já longo período: os ex-autarcas da agora União de Freguesias do Vade. Foram homenageados com pompa. Invariavelmente, todos homens, pois até algumas conquistas de Abril, como a igualdade de género, ainda não estão completamente consolidadas.
Um momento que o próprio presidente da assembleia municipal soube assinalar, ao destacar a presença da 1ª Presidente de Câmara do Concelho, Júlia Fernandes, na sua primeira comemoração oficial naquela função.
BLOCO DE ESQUERDA: Ricardo Cerqueira
«É tempo de desafiar a ferocidade do capitalismo…»
Neste domínio, destaque para o representante do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal, Ricardo Cerqueira, que tomou a palavra para afirmar que «é bonita a festa quando a Democracia é de todos, com todos e para todos. Mas vejamos a inconcebível disparidade de salários entre homens e mulheres, como elas estão mais expostas à precariedade laboral e como recai mais sobre elas o invisível e interminável trabalho doméstico e de cuidado dos mais jovens e dos mais idosos. Vejamos ainda a inexplicável minoria delas nos cargos de topo e nos vários poderes de decisão. Vejamos como estão as mulheres tão mais sujeitas a diferentes tipos de violência».
Ao discurso não podiam faltar, como é óbvio, uma das maiores “bandeiras” do BE, a luta contra o capitalismo: «Está na hora de juntar forças e perder o medo! É tempo de desafiar a ferocidade do capitalismo que enriquece com a guerra e com atrozes desigualdades, lembrando a magia da partilha, não como ato solidário que encha e inche orgulhos, mas como uma obrigação de um Estado democrata».
INDEPENDENTES: Samuel Estrada
«Felizmente, com a graça de Deus nosso Senhor, em Vila Verde não há razões para alarme…»
Em tom mais irónico e sarcástico, mesmo provocador, o presidente de Junta “independente” de Atiães, Samuel Estrada, falou dos «gritos apaixonados» da revolução que deram lugar a «bocejos enfadonhos». E concretizou: «O clima de festa, de euforia, das convicções e da esperança de construção de uma sociedade democrática e igualitária inaugurado como a revolução deu progressivamente lugar ao desencanto, ao desânimo e, por fim, ao desinteresse».
Referia-se ao desencanto atual sobre o poder local: «Municípios capturados por uma fauna de homens e mulheres sem ideário nem coração que transformaram municípios em centros de negócios e agências de emprego que usam apenas para manter o poder que abocanham há décadas».
Porém, Vila Verde – segundo a ironia providencial de Estrada – é um “oásis”: «Felizmente, com a graça de Deus nosso Senhor, em Vila Verde não há razões para alarme pois estamos a salvo destes males e tudo corre pelo melhor…».
O sarcasmo soltou-se ainda mais a encerrar a intervenção: «Viva Vila Verde. Viva Atiães…sem parques industriais!».
PARTIDO SOCIALISTA: Conceição Alves
«…temo que o futuro não nos reserve o tão almejado mundo novo»
Depois de uma lição sobre como aplicar as “cantigas de escárnio e maldizer”, de Gil Vicente, seguiu-se uma aula de história, pela representante da bancada do Partido Socialista, professora Conceição Alves.
Os factos históricos do 25 de Abril emborcaram no «inimigo invisível», referindo-se ao presente, a guerra da Ucrânia. «Uma vez mais, regressa a tirania e a liberdade do homem é duramente atacada em pleno século XXI».
Vaticinou: Foi assim no passado, é assim no presente e temo que o futuro não nos reserve o tão almejado mundo novo».
PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA: Susana Silva
«… temos um longo caminho a percorrer»
Ora, coube à representante do Partido Social Democrata, Susana Silva, atenuar um pouco o pessimismo geral e encontrar um País e um concelho onde «os níveis de bem-estar são muitíssimo superiores aos que existiam em 1974». Porém, notou que «a verdade é que ainda temos um longo caminho a percorrer».
Pediu, por isso, «a mesma coragem e convicção de outros tempos, com a mesma união que vivemos e enfrentamos a pandemia…».
JÚLIA FERNANDES – Presidente da Câmara Municipal
«… para nós, as pessoas são quem mais conta»
Depois de ouvir o presidente de Junta de Freguesia do Vade, Carlos Cação, solicitar alguns «projetos úteis para o desenvolvimento da nossa terra» (a Ecovia do Vade, alargamento das redes de saneamento e água, transformar sede da junta de Penascais em auditório nobre, revisão do PDM para fixar população e empresas), a presidente da Câmara Municipal, Júlia Fernandes, foi taxativa: «Como sempre disse, para nós, as pessoas são quem mais conta. Com a ajuda de todos os que quiserem trabalhar pela causa pública, tudo farei para proporcionar bem-estar e melhor qualidade de vida aos vilaverdenses, ajudando-os a serem capazes de gerar riqueza, criar emprego e tornar o nosso Concelho mais moderno, mais competitivo e cada vez mais atrativo».
De resto, a autarca lembrou o momento de incerteza que a Europa vive com a guerra na Ucrânia. Lembrou, por isso, que «Vila Verde faz jus ao desígnio da construção de um território solidário e inclusivo», enfatizando «a disponibilidade, a dedicação e o empenho das instituições, e de uma forma muito particular da Misericórdia de Vila Verde, das associações, das Juntas de Freguesia e muitas famílias vilaverdenses».
CARLOS ARANTES – Presidente da Assembleia Municipal
«Não se pode em momento algum, suspender a democracia e os seus ideais»
Depois de uma maratona de discursos, coube ao presidente da assembleia municipal, Carlos Arantes, ponderar sobre «os tempos que vivemos. São de desafios à nossa resistência e capacidade de resiliência. A pandemia colocou-nos à prova. Suspendeu o mundo das suas atividades e das suas dinâmicas. (…) Entretanto, somos confrontados com uma realidade que se traduz numa guerra, não muito longe de nós, inimaginável, pensávamos nós. Estão a ser colocadas incertezas nos nossos horizontes».
Mas, para o próprio, «não se pode em momento algum, suspender a democracia e os seus ideais»
Arantes, que voltou a presidir às cerimónias, a vincou, por isso, a necessidade de «defender os valores conquistados no 25 de Abril e respeitar os princípios fundamentais da nossa constituição, baseada num Estado de Direito democrático. A democracia entregou ao povo os destinos do país para garantir uma sociedade mais justa e equitativa. E está nas mãos de quem governa, o poder Central e o poder autárquico, garantir a manutenção das conquistas de Abril».
Refira-se, por fim, que as comemorações tiveram uma participação mais ativa das gentes do Vade, sobretudo das suas coletividades: o Centro Social de Covas, o Grupo de Jovens do Vade, o Grupo de Música “Stella Matutina”, a Associação Amigos de Atães, a Associação Cultural, Desportiva e Recreativa de Covas, o Grupo “Mulheres de Valões” , o Agrupamento de Escuteiros 498 – Portela do Vade, a Escola Básica do Vade, o Jardim de Infância do Vade e as Associações de Pais e Encarregados de Educação, a Escola de Música da Associação Cultural da Banda Musical de Aboim da Nóbrega, o Rancho Folclórico das Lavradeiras de Aboim da Nóbrega. Juntaram-se a Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Vila Verde e a Academia de Música de Vila Verde.