Há dias, eu e minha esposa fomos à escola da nossa filha contar uma história que remetesse para o tema dos afetos, atividade integrada no âmbito do Mês dos Afetos que é o mês de fevereiro. Escolhemos uma história chamada “Uma Lição de Amor” da autoria de Carmen Garcia e com ilustrações, muito apelativas, de Tiago Leal. Esta história retrata a vivência, em meio escolar, de um menino chamado Jaime que tem uma limitação motora que faz com que a sua vida seja passada, a maior parte do tempo numa cadeira de rodas. O Jaime chega à escola triste e cabisbaixo por se sentir um menino diferente dos outros, com incapacidades que não lhe permitiam fazer aquilo a que podemos chamar uma vida normal. Este é o ponto de partida da história que termina com o Jaime a perceber que, afinal, as diferenças exteriores, e visíveis aos nossos olhos, podem não ser assim tão importantes. Foi pela mão da sua amiga Leonor que o Jaime conheceu melhor a sua nova escola e os seus amigos, e percebeu que no coração, “no lugar onde mais importa, todos somos iguais”. A Leonor foi a amiga que o acolheu e o levou a viajar pela escola, apresentando-o a outros meninos, também eles, com outras incapacidades, outros problemas ou limitações mas que, apesar disso, tentavam fazer a sua vida normal. A Leonor soube aceitar a diferença e, até de forma ingénua, passou uma mensagem de esperança, de amor e que nos remete para o tema da inclusão.
No final da leitura da história propusemos às crianças uma atividade que consistia em convidá-las a dizer o que podiam fazer para ajudarem um amigo como o Jaime, ou com outras limitações, a viver de forma mais inclusiva e feliz. Foi giro perceber como as crianças manifestam uma disponibilidade, diria inata, tão natural para a inclusão e para o acolhimento de quem parece diferente.
A história é dirigida a crianças mas quantos adultos não a deveriam ler também? Será que nós, adultos, somos como a Leonor? Esta Lição de Amor aponta um caminho. Apela-nos para que tenhamos a capacidade de reconhecer que não somos todos iguais, nem temos que ser, e que podemos todos ser unidos nas nossas diferenças.
Interrogo-me se vivemos num país suficientemente inclusivo. Eu acho que estamos todos a caminhar para uma sociedade mais inclusiva mas será que já fizemos o suficiente?
Estão as nossas escolas totalmente preparadas para a inclusão de todos? Estão dotadas de recursos estruturais, materiais e de recursos humanos que permitam às nossas comunidades educativas acolher todos de forma igual, mesmo aqueles que, por força das suas circunstâncias psicomotoras ou outras, exijam mais atenção, mais recursos e disponibilidade?
Está o nosso Serviço Nacional de Saúde dotado de capacidade para prestar os cuidados que muitas crianças, com doenças crónicas, doenças raras e limitações psicomotoras mais graves necessitam? Quantos pais não têm que arcar com os custos imensos de terapias para estimulação sensitiva e psicomotora, sem a devida comparticipação do Estado? Quantos pais conhecem os seus direitos relativamente àquilo que são as ajudas que o sistema de Segurança Social lhes pode dar? Está esta informação acessível a todos e suficientemente divulgada? Porque é que algumas famílias ainda precisam de recolher tampinhas de garrafas para conseguirem a cadeira de rodas que pode mudar a vida dos seus filhos? Ainda há um longo caminho a percorrer no apoio às famílias e aos pais de filhos com doenças raras, incapacitantes.
As IPSS desempenham um papel muito relevante e deveras importante nesta matéria, mas existem em número suficiente para suprir as necessidades? Quantos aguardam vagas numa instituição que os possa acolher e ajudar?
Convido o leitor a responder a cada uma destas perguntas. Arrisco dizer que, talvez, as respostas não sejam as que todos desejávamos. As minhas não são. Considero, apesar de tudo, que estamos a trilhar caminho na direção certa, porém, muito lentamente e, ainda, no início de uma longa caminhada.