Uma equipa liderada pelo Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) da Escola de Medicina da Universidade do Minho demonstrou em ratinhos um tratamento capaz de reduzir a progressão de sintomas motores e de anomalias neuronais na doença de Machado-Joseph.
O estudo saiu no “Journal of Clinical Investigation” e propõe um ácido do fígado como potencial fármaco, sendo considerado seguro para ensaios clínicos em humanos.
A equipa usou o ácido tauroursodeoxicólico (TUDCA) quer de forma injetada quer como suplemento nos alimentos. Em ambos os casos, registou-se nos modelos animais a redução de inflamação no cérebro, dos sinais de degeneração e da morte de neurónios, mas também uma clara melhoria dos sintomas motores e um atraso na progressão da doença.
“Estamos a abrir portas para uma possível opção terapêutica e identificamos um eventual alvo para desenvolver novos fármacos, trazendo esperança às famílias afetadas por esta doença crónica”, diz a investigadora Patrícia Maciel, vincando a conveniência de, caso seja aprovado, o medicamento poder vir a ser administrado oralmente.
O TUDCA é produzido no fígado e libertado para o intestino, facilitando a absorção de gorduras alimentares. Porém, parece ter também um papel no cérebro, tendo já havido ensaios em pacientes de doenças neurodegenerativas como Alzheimer e Parkinson. A equipa de Patrícia Maciel testou então esse ácido biliar, pela primeira vez, como terapia para a doença de Machado-Joseph.
Também conhecida como “doença do tropeção” ou ataxia espinocerebelosa, esta doença é hereditária, rara e incapacitante, surgindo em geral na idade adulta e com sintomas motores progressivos, como desequilíbrio, descoordenação de movimentos e dificuldade a falar e a engolir, até à eventual paralisia total. Atinge 0.3 a 2 pessoas por cada 100 mil adultos, mas na ilha das Flores (Açores) afeta 1 em cada 140 adultos. Não há ainda tratamento, só opções de alívio temporário dos sintomas.
DESCOBERTA INTERAÇÃO NO CÉREBRO
Os investigadores tinham encontrado evidências da disfunção do recetor de glucocorticoides tanto no cérebro como no sangue de pacientes com a doença de Machado-Joseph. Isso coincide com os dados agora obtidos nos modelos animais. “Sugere assim que o composto que estudamos terá potencial para ser utilizado em pacientes, devendo então seguir para ensaios clínicos; aliás, o TUDCA é um ótimo candidato, por ser seguro, mesmo a longo prazo, e com poucos efeitos secundários”, frisa Patrícia Maciel.
A equipa do ICVS incluiu também Sara Duarte-Silva, Jorge Diogo da Silva, Daniela Monteiro-Fernandes, Marta Daniela Costa, Andreia Neves-Carvalho, Carina Soares-Cunha, Joana S. Correia, Gonçalo Nogueira-Goncalves, Stephanie Oliveira, Ana Ferreira-Fernandes, Fernando Rodrigues, Joana Pereira-Sousa, Daniela Vilasboas-Campos, Sara Guerreiro, Jonas Campos, Liliana Meireles-Costa e Andreia Teixeira-Castro. O trabalho envolveu igualmente cientistas das universidades do Porto, de Lisboa e de Toulouse (França).