Opinião de Margarida Dias
Há poucos meses mudei de casa. E enquanto arrumava as minhas coisas e selecionava o que queria guardar, encontrei um anuário da escola. Era de 2002, tinha eu 12 anos, e constava lá como finalista do 2º ciclo do ensino básico. Ao folhear li, no perfil de uma antiga colega, a frase “Ser feliz e saber que sou”, em resposta à pergunta: Qual é o teu objetivo de vida?
A primeira parte – “ser feliz” – seria expectável, afinal qual é o ser o humano que não busca a felicidade? A segunda parte – “e saber que sou” – suspeito da sua origem. Foi provavelmente de tanto ouvir os adultos que nos rodeavam dizerem a típica frase “Era feliz e não sabia!”, sempre que algo de mal lhes acontecia.
Ambas as frases partem do pressuposto de que podemos ser felizes sem o sabermos. Ao mesmo tempo, a preocupação da minha colega em querer saber e não apenas ser feliz, mostra que ela não acreditava muito nisso.
Podemos então suspeitar que o “ser feliz” refere-se, não ao sentimento, mas antes a um conjunto de condições de vida que poderiam permitir-nos sentirmo-nos felizes. A questão aqui é que, aparentemente, só na perda de uma ou mais dessas condições é que nos apercebemos que poderíamos ter sentido felicidade e não sentimos.
Uns dirão que é porque o ser humano quer sempre mais e essa é a nossa natureza; outros que é porque vivemos em piloto automático e não sabemos aproveitar os bons momentos; e outros ainda certamente encontrarão outras teorias.
A meu ver, diria que hoje assistimos a uma clara busca pelas condições que consideramos que nos vão trazer o sentimento de felicidade, e a um esquecimento da busca pelo sentimento em si. Com o foco constante naquilo que nos falta para a felicidade plena, perdemos a atenção no que está bem. E só na perda de saúde, condições financeiras ou de alguém querido é que nos apercebemos que poderíamos ter sentido mais felicidade. Será que é por isso que tantas pessoas dizem ter “acordado” para a uma vida mais feliz depois de terem passado por alguma tragédia? E por outro lado, também os há, aqueles que aparentemente tendo todas as condições consideradas ideais para uma vida feliz – família, amigos, dinheiro, sucesso e reconhecimento – acabam por não o ser. Alcançaram as condições mas não o sentimento prometido por elas.
Esta reflexão levou-me a dar prioridade e atenção à forma como me sinto. Levou-me também a ter as minhas condições mínimas bem definidas, e independentemente de estar a procurar melhorá-las diariamente, percebi que posso escolher aperceber-me constantemente que já as tenho, e então ser feliz e saber que sou.