Opinião de Rafael Gonçalves Fernandes, criminólogo.
A radicalização é o procedimento pelo qual determinado indivíduo se afasta da visão predominante da sociedade à qual pertence. Este processo ocorre de modo diferente de pessoa para pessoa, pois é influenciado por diversos fatores, nomeadamente individuais, familiares ou grupais, entre outros. Um dos fatores que contribuem para aquilo que é o terreno fértil da radicalização são as sociedades polarizadas.
Felizmente, o terrorismo não é considerado pela maior parte da sociedade como um comportamento tolerável, logo alguém que defenda e pratique este tipo de ações irá ter um comportamento manifestamente radicalizado. Apesar de existirem diversos níveis de identificação com determinada causa, a radicalização é aquela que acarreta maior preocupação, pois existe a aceitação de que a violência é um meio necessário e legítimo para afirmar os objetivos políticos ou ideológicos.
Como referido anteriormente, o processo da radicalização é diferente de pessoa para pessoa, no entanto existem algumas etapas que têm necessariamente de ser cumpridas, nomeadamente identificar-se com determinada causa e utilizar todos os mecanismos ao seu dispor para defender essa mesma causa, inclusive a violência e a prática de diversos crimes, como o homicídio.
Além da polarização da sociedade, existem outros fatores que contribuem para fomentar a possibilidade de alguém aderir a este tipo de grupos, mais concretamente: exclusão económica, exclusão política, desigualdades, injustiça, banalização da violência, falta de segurança, sentimento de alienação da sociedade, entre outros.
O facto de determinado indivíduo sentir-se alienado da sociedade, sentir que não pertence à sociedade, sentir que não se identifica com a mesma, irá promover neste a necessidade de procurar um ambiente, ou um grupo onde o aceitem da forma como este é, ou seja, procurar o sentimento de pertença. Um desses grupos pode ser uma organização terrorista. Como tal, é importante que todos se sintam integrados na sociedade e que façam parte da mesma, que desempenhem um papel ativo e importante naquilo que é a participação e convivência natural da vida em sociedade.
A internet assume um importante papel naquilo que é o processo da radicalização. Atualmente, a internet é um importante veículo de difusão de conteúdo e propaganda extremista, que além de alimentar o processo de radicalização contribui para a vontade de alguém se alistar a este tipo de movimentos. Alguém com disposição de aderir a um grupo terrorista, se for constantemente confrontado com propaganda deste tipo de índole, irá potenciar no indivíduo a possibilidade desse mesmo alistamento. Além disso, a internet permite contactar facilmente com pessoas em todo o mundo, nomeadamente com terroristas, que muitas vezes utilizam a plataformas de videojogos e redes sociais para captar novos membros para as suas organizações.
Alguns anos atrás verificou-se que o Estado Islâmico difundia na internet manuais de formação para pessoas recém radicalizadas, de modo que estes aprendessem a construir bombas e praticar atos terroristas. Ou seja, não há a necessidade de deslocações ou de interações pessoais entre os terroristas para que se consiga praticar estas atividades extremistas.
De acordo com João Paulo Ventura, coordenador de investigação criminal da Polícia Judiciária, e um dos mais notáveis especialistas de terrorismo em Portugal, existe um conjunto de indicadores que identificam ou sinalizam que determinada pessoa está a passar pelo processo de radicalização e como tal é necessário estar atento a esses sinais.
Dessa lista de indicadores, destacam-se alguns, nomeadamente adoção da visão maniqueísta e as duas cores do mundo, promoção de ideias e discursos extremistas, viagens e permanências mais ou menos alongadas em locais específicos como regiões de conflito insurgente, mudança de práticas e rituais religiosos, participação em reuniões clandestinas e reservadas, posse de material de propaganda, recurso a tatuagens com logótipos ou símbolos, transformar a aparência física como deixar crescer ou rapar barba e cabelo, entre outros.
A prevenção da radicalização terrorista exige uma abordagem multidisciplinar e complexa, envolvendo diversos setores da sociedade. Desde tenra idade deve ser incutido aos jovens a necessidade de pensamento crítico, assim como a resistência à propaganda terrorista. Deve-se formar a sociedade para identificar sinais precoces de radicalização.
É ainda importante promover uma correta integração dos indivíduos na sociedade. É necessária uma maior fiscalização e controlo dos conteúdos extremistas disponibilizados na internet. Além disso, deve haver uma extensa colaboração entre a sociedade civil, forças e serviços de segurança e empresas tecnológicas, de modo que sejam detetados conteúdos extremistas/radicais e que estes sejam rapidamente excluídos.