OPINIÃO

OPINIÃO -

A ressocialização no sistema prisional

Texto: Rafael Gonçalves Fernandes (criminólogo)

A ressocialização no sistema prisional é alvo de discussão há várias décadas em todo o mundo, devido à sua complexidade. Neste artigo de opinião, e conforme o espaço que tenho disponível para o fazer, irei dar uma breve explicação sobre o tema em apreço.

A prisão é umas das principais penas aplicáveis nos sistemas penais de todo o mundo, sendo esta aplicada em última ratio na maioria dos países, à exceção daqueles que infelizmente ainda recorrem à pena de morte.

Conforme o art. 40.º do Código Penal, a aplicação de penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração dos agentes na sociedade e jamais a pena pode ultrapassar a medida da culpa.

De forma geral, a sociedade quando tem conhecimento da ocorrência de um crime espera que em contrapartida seja aplicado ao criminoso um “castigo”, no caso a pena de prisão, de forma a pagar todo o mal provocado. A pena, como é obvio, tem um caráter de repressão pelo facto de o agente ter praticado um crime. Mais que reprimir, a pena visa ressocializar o indivíduo, portanto é necessário intervir junto dele no sentido de evitar que no final da pena reincida criminalmente.

Em Portugal, a execução da pena é legislada segundo o Código Penal (CP) e o Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade (CEPMPL). Segundo o art. 2.º do CEPMPL, “a execução de penas e medidas de segurança visam a reinserção do agente na sociedade, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável”.

Nos tempos primitivos, a reação ao crime não resultava em mais nada a não ser a utilização da vingança privada, que era exercida pelo queixoso ou pela sua família, caracterizados por atos bárbaros e altamente nocivos à vida humana. A famosa Lei de Talião que defendia “olho por olho, dente por dente” procurava punir o criminoso da mesma forma com que praticava o crime. Se alguém roubasse cortava-se a mão e esta ação era vista como uma reposição da paz e a plena realização da justiça. Não havia qualquer preocupação com a ressocialização.

Um importante acontecimento foi a passagem da vingança realizada pela sociedade numa espécie de justiça privada para uma justiça pública tutelada na altura pelo poder régio. Neste novo sistema de justiça, o rei pretendia obter a prevenção geral com a aplicação de penas severas que chocassem e intimidassem a população de praticar tais atos. Os criminosos eram decapitados, queimados e apedrejados em praça pública de forma propositada para que todos vissem, fazendo com que tais atos servissem de exemplo para a restante população.

Com o Iluminismo surgiram os primeiros ideais de direitos humanos e através da obra de Beccaria “Dei delliti e delle pene”, foram formuladas as primeiras garantias dos direitos humanos e qual a legitimidade da aplicação das penas, assim como a abolição da pena de morte, o fim das torturas e penas desumanas, direcionando a pena para um fim utilitário e de prevenção. Passamos assim da aplicação de penas bárbaras para a aplicação de pena de prisão pelo Estado.

A ressocialização é algo positivo, de termos sociais a termos económicos, pois se um indivíduo não reincidir na sua prática criminal, a curto e longo prazo, o Estado não irá assumir novamente o pagamento dispendioso de manter uma pessoa em situação de reclusão. Segundo dados atuais, um recluso custa cerca de 56,33 euros por dia ao Estado Português. No final de uma pena de prisão de 25 anos são mais de 500 mil euros.

Além disso, em termos sociais, se a ressocialização for realizada com sucesso, o recluso não cometerá mais crimes e a sociedade não irá sofrer mais com as práticas criminais desse sujeito. Obviamente, é necessário haver por parte do recluso a vontade de mudança, não deve ser algo imposto. Até porque se o indivíduo estiver contrariado será um investimento irrelevante, enquanto se poderia estar a intervir num recluso que realmente tem força de vontade em mudar o rumo da sua vida.

A pena de prisão tem um efeito altamente dessocializador, é imperativo que algo seja feito. Que seja realizada alguma intervenção e que essa produza efeitos, pois como sabemos as prisões são autênticas escolas do crime. Se algo não for realizado no sentido de prevenir a recidiva, o recluso no final da pena irá estar em pior estado do que no início da pena, o que jamais pode acontecer.

 

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