Desde o início da atual pandemia foram dadas instruções de confinamento aos cidadãos, estimulando-se o recato pessoal e o isolamento de cada um, junto do seu agregado familiar. Apesar de algumas exceções evidentes, a minha perceção pessoal é que os portugueses seguiram, na medida do possível, as orientações emanadas pelas autoridades de saúde e do governo, adotando, nas últimas semanas, um estilo de vida mais recatado e dentro de muros, como se pretendia. Ademais, não tenho dúvidas que as orientações dadas a nível nacional no contexto da pandemia não teriam quaisquer reflexos positivos se não contassem também com o “braço armado” das estruturas regionais e locais, nem com a aceitação que, aparentemente tiveram, por parte da população.
Tudo isto resultou num aparente controlo da pandemia, evitando que Portugal enveredasse pelo caminho penoso por onde ainda trilham, infelizmente, a Espanha e a Itália. Este comportamento refletiu-se no número de internamentos hospitalares que ficou, ao contrário de outros países europeus, aquém de atingir, ainda, a nossa capacidade máxima. De facto, as razões que estiveram na base da promoção do confinamento foi o de evitar a exaustão dos nossos serviços de saúde que, se fosse atingida, tornaria mais difícil o controlo da pandemia, podendo, esse descontrolo, repercutir-se numa escalada de mortalidade que todos queremos evitar.
Tivemos, porém, um governo que foi, manifestamente, incoerente ao promover (e bem), um estado de emergência e, por outro, ao abrir exceções que pecaram pelo mau exemplo que nos transmitiram. A incoerência foi de tal modo gritante que, numa entrevista, a Ministra da Saúde “meteu os pés pelas mãos” ao tentar defender o indefensável. É muito difícil defender a incoerência, sem dúvida! A aprovação do estado de emergência abriu as portas ao confinamento compulsivo no domicílio e à interdição de deslocações e permanências desnecessárias na via pública e, entre outras coisas, permitiu também limitar o direito de reunião e de manifestação que, “pelo número de pessoas envolvidas, potenciem a transmissão do novo coronavírus.” Ora, no 1o de maio, foi chocante ver centenas de pessoas espalhadas na Alameda a gozarem de privilégios que outros não tiveram e, pior do que isso, a potenciarem riscos inaceitáveis para a saúde pública que, por mais precauções que se tivessem, dificilmente foram evitados. Que se comemorasse o 1o de maio, sim. Mas de outra forma, bem mais recatada! Do mesmo modo, teria sido preferível assinalar da data comemorativa do 25 de abril de 1974 de uma outra forma, mais simples, mas igualmente digna. É caso para dizer que, aqui, também, o exemplo não veio de cima, como seria desejável. Até penso que este episódio contribuiu para acicatar na opinião pública a ideia, já enraizada, de que, nem sempre, os nossos políticos são os melhores a dar o exemplo.
Estas posições contrastam com o bom exemplo que a Igreja Católica tem manifestado no decurso desta pandemia revelando uma profunda coerência, respeito pelo próximo e sempre em linha com a defesa do valor inestimável da vida. A Igreja tem sabido ocupar o seu lugar, respeitando e acatando as diretrizes e orientações das autoridades de saúde. Contribuiu, por isso, para a preservação da saúde pública ao fazer, corajosamente, aquilo que nunca, na sua/ nossa História, aconteceu. Adaptou-se às novas circunstâncias propondo formas alternativas para a vida na fé. Nem mesmo este entreabrir de portas por parte da Ministra da Saúde relativamente à possibilidade de presença de peregrinos nas celebrações do 13 de maio, em Fátima, fez a Igreja mudar o rumo, mantendo a prudência e a firmeza na defesa da vida e da saúde pública. Um bem-haja.