Numa sessão ‘reduzida’ à deposição de uma coroa de flores em memória do Papa Francisco e aos tradicionais discursos e momentos musicais, nem a ‘gasolina do Luís’ expelida pelo Bloco de Esquerda (num «discurso de ódio e mentiras», segundo Júlia Fernandes) tirou brilho à participação dos agentes comunitários do Vale do Homem. Coucieiro esteve à altura do convite para a sessão descentralizada das comemorações do 51º aniversário do 25 de Abril. E, porque «ainda falta cumprir Abril» (Joaquim Gonçalves- PS), o presidente da Assembleia Municipal, Carlos Arantes, deixou o mote: «Abram as portas das vossas freguesias à participação jovem!».
Foi com o hastear das bandeiras em frente aos Paços do Concelho e com a deposição de flores em homenagem ao Papa Francisco que se iniciou a evocação do 51º aniversário da ‘Revolução dos Cravos’ em Vila Verde. De resto, a figura do sumo-pontífice marcou toda a sessão solene, que prosseguiu no salão paroquial de Coucieiro, Vila Verde, depois do acolhimento pelo Rancho Folclórico de Valdreu, os escuteiros locais e até a equipa de Enduro de Santa Ana do Monte (Paçô).
Um dia «de memória e afirmação de valores de Abril», que «mostra a união e capacidades do Vale de Homem», como quis evidenciar o presidente de junta local, o anfitrião Luís Ferreira. Este quis ainda lembrar «a memória do padre João Alves», que «deixou um legado vivo».
Depois de um início prometedor, pela participação das crianças e jovens das escolas de Lanhas e Oriz, os discursos vieram trazer ‘gasolina’ a uma cerimónia marcada pela figura do Papa Francisco, um «defensor da paz, inclusão e dos mais vulneráveis. Tratou todos com respeito e humildade. Construiu pontes», como referiu o presidente da assembleia municipal de Vila Verde, Carlos Arantes.
RICARDO CERQUEIRA (BE) ESQUECEU AS PONTES E TROUXE GASOLINA
Indiferente a isto, em período de pré-campanha, o candidato distrital do Bloco de Esquerda, Ricardo Cerqueira, lembrou «o “Luís” – o da canção que não me fica no ouvido e não aprecio, tanto a canção como, claro, ainda menos o seu desempenho enquanto Primeiro-Ministro».
E incendiou os ânimos: «O PSD não recebeu donativos de empresas, só dos donos das empresas. Nós não nos confundimos. E assim opta por lançar gasolina – e também em Vila Verde temos uma nova gasolineira prestes a ser inaugurada (por acaso cliente do Luís, que quer trabalhar) – e muitas faíscas sobre a falta de credibilidade de políticos. Quanto desplante! Não nos confundimos. Tudo, tudo, tudo, negócio de alguns, negócio para alguns!».
Com o cravo em punho, Ricardo Cerqueira, clarificou: «Mas a crítica não é à Democracia que hoje celebramos. A merecida crítica é a pessoalizada nos comportamentos de alguns. A Democracia é de todos, todos, todos! É e tem de ser isso a Democracia! Por isso não é nem pode transformar-se, também no poder local, numa ditadura da maioria».
Mais tarde, no seu discurso, Júlia Fernandes respondeu: «O Papa Francisco foi um farol no meio de tantas incertezas. Defendeu a igualdade, solidariedade e respeito por cada ser humano».
Com isto, afirmou que «alguns discursos são inverdades e mentiras. Não é correto trazer para esta cerimónia discursos de ódio e mentiras. É com isto que a esquerda radical alimenta a direita radical».
PAULO GOMES (INDEPENDENTE – CDS-PP):
«Discursos extremistas e populistas … ameaçam beliscar os alicerces da democracia»
Em tom mais sereno e conciliador, o deputado independente do CDS-PP na assembleia municipal, Paulo Gomes, deu algumas pistas para uma sã convivência democrática: «A democracia, que, como cultura, precisa ser vivida diariamente, com respeito pela diversidade de pensamento e compromisso com o bem comum. A democracia não é apenas um regime, mas uma cultura que exige de cada um de nós a responsabilidade de pensar livremente, de discordar quando necessário e de participar ativamente».
Lembrou, contudo, que, «Nos dias de hoje, enfrentamos desafios novos e inquietantes. O crescimento de discursos extremistas e populistas, que exploram o descontentamento e simplificam problemas complexos com soluções ilusórias, que ameaçam beliscar os alicerces da democracia. A verdade cede por vezes, lugar à manipulação. O debate plural é substituído pela polarização».
Aliás, referiu que «os direitos, outrora conquistados com sacrifício, são tratados com ligeireza. Não podemos também ignorar o ressurgir de formas de violência — cada vez mais verbal e online — que cultivam o ódio e a xenofobia».
No mesmo tom que a autarca social-democrata, Paulo Gomes sublinhou que «os discursos de ódio, dirigidos contra pessoas por causa da sua origem, da sua fé ou da sua diferença cultural, violam os princípios de Abril e corroem o respeito mútuo que sustenta a nossa comunidade. Quando a retórica inflamada transforma seres humanos em bodes expiatórios, todos perdemos; e a democracia, ao tolerar esse tipo de intolerância, deixa de honrar o legado dos cravos».
Para tal, diz ser importante «recusar o autoritarismo disfarçado, rejeitar a intolerância como método e combater a desinformação com educação e consciência cívica. A democracia não é um estado garantido; é um processo vivo, exigente, que precisa de participação informada, espírito crítico e defesa intransigente dos valores fundamentais».
Quanto ao futuro, anseia «que as novas gerações saibam reconhecer o valor inestimável da liberdade. Que não se deixem seduzir por discursos fáceis nem por nostalgias perigosas. Que saibam transformar Abril em projetos concretos, em igualdade real e em justiça efetiva».
JOAQUIM GONÇALVES (PS):
«Ainda há um longo caminho para cumprir abril».
O Partido Socialista, pela voz do deputado municipal Joaquim Gonçalves, fez questão de sublinhar que «isto é viver abril, mas ainda há um longo caminho para cumprir abril». Ou seja, «cumprir abril pela participação de todos os cidadãos diretamente ou por meio de representantes, na formulação das leis e políticas, no respeito pelas diversas opiniões, crenças e ideologias». Mas também «na garantia da liberdade, com leis e instituições independentes, em que o estado garanta os direitos fundamentais, como a saúde, educação, justiça, segurança e a sustentabilidade económica, social e ambiental». E ainda «pelo combate a crenças e políticas sociais que enfatizam o nacionalismo extremo, o autoritarismo, a hierarquia social rígida, o racismo, a xenofobia, a misoginia, a violência doméstica e a supremacia étnica ou cultural».
Não escondeu ainda a sua preocupação pelo «processo de desglobalização» que vivemos, «com incremento na redução da interconexão económica, política, social e cultural entre países».
A nível local, assinalou a necessidade de um combate à «precariedade na Habitação. No âmbito do 1º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, em 2022, o Município celebrou um acordo de colaboração com a Secretaria de Estado da Habitação e a Secretaria de Estado da Administração local e Ordenamento do Território, para execução de um plano de recuperação habitacional, com um valor de investimento, estimado em mais de 12.600.000 euros). Este acordo não está em execução, não estamos a cumprir abril».
E foi mais longe: «Cumprir abril é ainda minimizar os impactes das alterações climáticas».
MANUEL BARROS (PSD)
Poder Local como «pilar essencial da democracia de proximidade»
Pela bancada do PSD, coube ao coucieirense Manuel Barros iniciar a sai intervenção com a homenagem à memória do Papa Francisco, evocando o seu legado «junto dos mais necessitados e na defesa do planeta».
Enfatizou a relevância das primeiras eleições autárquicas de 1976 e destacou o Poder Local como «um pilar essencial da democracia de proximidade» e «um motor fundamental para o desenvolvimento cultural, social e económico adaptado às realidades locais».
Reconheceu o trabalho autárquico desenvolvido em Vila Verde, elogiando a «profícua colaboração entre a Câmara Municipal», atualmente presidida por Júlia Fernandes, e as Juntas de Freguesia.
Foram também enumeradas diversas conquistas e projetos concretizados no Vale do Homem, «que refletem o progresso da região».
Mencionou «a requalificação de vias de comunicação, a expansão de infraestruturas digitais como a fibra ótica, o fomento do turismo sustentável com valorização dos recursos naturais e patrimoniais, investimentos em saneamento básico, e o reforço de equipamentos sociais, de saúde, culturais e desportivos».
JÚLIA FERNANDES (Presidente da Câmara Municipal)
Usou referência ao papa Francisco para «construir democracia e liberdade»
A presidente da Câmara, Júlia Rodrigues Fernandes, apontou o legado do Papa Francisco como referência para «construir democracia e liberdade».
«Neste dia em que celebramos a liberdade conquistada, é oportuno refletirmos sobre a liberdade interior e coletiva que Francisco nos convida a cultivar: uma liberdade que se constrói no respeito, na fraternidade e no serviço ao outro», desafiou a autarca.
Alertando para esta «época de tantas incertezas», a presidente da Câmara apontou o Papa como «um farol». Destacou o compromisso «com os mais pobres, os migrantes, o meio ambiente e a paz», inspirando «líderes e cidadãos de todas as culturas e religiões».
À «mensagem universal, profundamente humana e inabalavelmente comprometida com a dignidade de cada pessoa» partilhada do Papa, a única mulher presidente de Câmara do Minho associou «os valores de Abril».
«A democracia, a liberdade e a fraternidade, com maior ou menor custo, terão sempre de vencer», defendeu, contextualizando a determinação para «Vila Verde prosseguir no trilho da modernidade, do crescimento económico e da afirmação das suas potencialidades endógenas».
Júlia Rodrigues Fernandes dirigiu-se a todos os presentes, identificando bandeiras a defender «em nome do progresso e da prosperidade das nossas freguesias e do direito de todas as pessoas a uma vida digna e feliz».
A coesão social e territorial, a educação e a saúde, o ambiente, os investimentos em infraestruturas e equipamentos, a ação social e o apoio àqueles que mais necessitam, a atratividade e a competitividade local… são ‘bandeiras’ que terão de continuar a ser erguidas «bem alto, por todos».
CARLOS ARANTES APELA AO ENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS JOVENS NAS FREGUESIAS
Os presidentes da Junta de Coucieiro, Luís Ferreira, e da Associação de Freguesias do Vale do Homem, Bruno Eiras, assumiram as boas-vindas, numa cerimónia que contou com a participação do Rancho Folclórico de Valdreu, do Agrupamento de Escuteiros de Coucieiro, do Grupo Coral do Vale do Homem, Centro Social do Vale do Homem, utentes do lar da Misericórdia em Valbom e alunos das escolas básicas e jardins de infância do Vale do Homem.
O presidente da Assembleia Municipal, Carlos Arantes, encerrou a sessão, que apontou como um «exemplo da importância e da oportunidade de participação de voluntários, grupos, associações e autarquias» para se cumprir «o espírito de Abril».
Nesse contexto, Carlos Arantes deixou ainda um desafio às juntas de freguesia e Município para uma «aposta nas plataformas digitais de forma a promover a participação de jovens nos processos de decisão e intervenção nas suas comunidades».
ovilaverdense@gmail.com