O Tribunal da Relação de Guimarães confirmou a condenação de um homem de 88 anos a sair da casa em que residia com a mulher há mais de 60 anos, em Esposende, no âmbito de um processo por violência doméstica.
Por acórdão do passado dia 6, consultado esta quarta-feira pela Lusa, aquele tribunal refere que a idade do arguido “não pode servir para o premiar, em prejuízo da vítima dos maus-tratos, que é quem tem de ser protegida”.
“A idade também não o coibiu de continuar a sujeitar a mulher a comportamentos humilhantes, ofensivos da sua integridade física e psicológica e que ainda não interiorizou serem desconformes à lei”, acrescenta.
O tribunal admite que a obrigação de sair de casa possa causar constrangimentos ao arguido, atenta até a sua idade, mas considera que a mesma é “necessária, proporcional e adequada à supremacia dos direitos da vítima, especialmente vulnerável pela sua condição física e estado de saúde (doente oncológica)”.
O arguido alegou que abandonar a casa em que construiu toda a sua vida pode ser um evento traumático para a sua vida e um problema para a sociedade e que é desumano e inqualificável o entendimento do tribunal recorrido ao decidir aplicar-lhe a pena acessória.
No entanto, o tribunal contrapôs que “desumano e inqualificável foi o comportamento assumido pelo arguido ao longo da sua vida para com a mulher, manifestando total desrespeito pela mesma, ofendendo-a na sua honra e dignidade, diminuindo-a enquanto pessoa”.
Sublinha ainda que o arguido desvaloriza a sua conduta, chegando ao ponto de referir que o faz “por brincadeira” e “só em casa, nunca na rua”.
“Urge que a vítima possa viver o seu dia a dia dentro da normalidade e com a tranquilidade de que necessita, atenta a doença de que padece, sem receio de ataques verbais, psicológicos e físicos”, lê-se ainda no acórdão.
Segundo o tribunal, o arguido, desde o início do casamento, adoptou um comportamento agressivo com a mulher, agredindo-a física e verbalmente “sem qualquer motivo”, cuspindo-lhe em cima e não a deixando sair de casa quando a ela queria.
Na noite de Natal de 2016, o arguido terá desferido uma pancada, com a mão aberta, no cachaço da mulher, fazendo com que ela caísse ao chão.
A partir de inícios de 2019, o arguido intensificou o consumo de álcool ao almoço, pelo que, após esta refeição, diariamente, insultava a mulher.
No Tribunal de Esposende, foi condenado a dois anos e nove meses de prisão, com pena suspensa pelo mesmo período.
Como pena acessória, o tribunal proibiu-o de contactos com a vítima e obrigou-o a afastar-se da residência do casal, também pelo período de dois anos e nove meses, mediante fiscalização por meios técnicos de controlo à distância
O arguido recorreu sobretudo da obrigação de afastamento da residência, alegando que é o único cuidador da mulher, de 76 anos, que sofre doença oncológica e de obesidade, apresentando ainda “marcha claudicante”.
Para o tribunal, mesmo a admitir-se que o arguido prestasse algum auxílio à mulher, “qualquer pessoa no lugar desta preferirá ser auxiliada diariamente por uma terceira pessoa (familiar ou não) do que continuar a sujeitar-se a ser humilhada reiteradamente pelo marido”.
Em tribunal, a vítima não quis prestar declarações.
O arguido terá ainda de pagar 2.000 euros à vítima e fica proibido de uso e porte de arma pelo período de cinco anos.
As armas e munições apreendidas na residência do casal foram declaradas perdidas a favor do Estado.