O Ministério Público pediu esta sexta-feira, no Tribunal de Braga, a condenação dos três arguidos julgados por alegada corrupção no processo de privatização, em 2012, da Escola Profissional Amar Terra Verde, de Vila Verde. A magistrada disse que a acusação ficou provada. Já os três advogados de defesa pediram, nas alegações finais, a absolvição, porque “rigorosamente nada” se provou.
“A única dúvida refere-se ao depoimento de um troca-tintas, que disse duas vezes uma coisa e outras duas o seu contrário”, afirmou Artur Marques, aludindo às declarações do gerente da Caixa de Crédito Agrícola de Vila Verde, José Santos, sobre uma alegada ‘cunha’ que o então presidente da Câmara, António Vilela, teria metido para que o banco desse uma garantia bancária à empresa ValD’Ensino, a vencedora do concurso de privatização.
“Mas, mesmo que tivesse havido cunha, isso não é crime nenhum”, sustentou.
O jurista acentuou que o bancário disse, na fase de inquérito à PJ que não tinha havido ‘cunha’, dias depois afirmou o contrário ao Ministério Público, contradições que repetiu em audiência, já que num dia afirmou que Vilela nada lhe pedira e na sessão seguinte veio dizer o contrário, justificando-se com o facto de naquele dia “estar perturbado”.
Além de Vilela, foram julgados o ex-vereador Rui Silva e o gestor da escola, João Luís Nogueira, todos eles suspeitos de terem urdido um esquema para beneficiar a Vale D’Ensino, com um concurso do tipo «fato à medida».
DESMONTAM A ACUSAÇÃO
Nas alegações, os advogados Artur Marques, Reinaldo Veloso Martins (defensor de Rui Silva) e Sebastião Quarenta (representando João Luís Nogueira) tentaram desmontar a acusação. Marques começou por contraditar o MP, na tese de que a Câmara de Vila Verde pagou, após a privatização, uma verba de 900 mil euros como favor à EPATV: “ficou mais do que provado que a dívida existia e que o acordo alcançado entre as partes no Tribunal Administrativo foi benéfico para o Município”, disse.
Sobre a nomeação de Rui Silva, então vereador, para presidir ao júri do concurso, o que a acusação considera ter sido feito para favorecer a ValD’Ensino, o causídico negou que isso fosse verdade, salientando que Silva foi “a segunda escolha”, isto porque a pessoa convidada para a função não aceitou.
A acusação diz que João Luís Nogueira, que era então o diretor da EPATV, foi beneficiado por ter participado na elaboração do caderno de encargos do concurso. Hipótese refutada por Artur Marques: “o João Luís Nogueira conhecia a escola e a sua realidade, pelo que a sua participação no processo era como que obrigatória”, defendeu, perguntando: “quem outro poderia ter dado tal contributo?”
Acrescentou que o caderno de encargos do concurso foi feito de forma “irrepreensível”, e disse ter ficado provado que foram cumpridos todos os procedimentos para que o concurso fosse devidamente publicitado e houvesse vários concorrentes: “houve três ou quatro interessados, que pediram cópia, do caderno, mas que decidiram não concorrer, alegando que a dívida e os encargos financeiros da EPATV eram muito grandes”.
Ou seja, “não concorreram porque não quiseram e nenhum se queixou de nada”, sublinhou.
GARANTIA BANCÁRIA
A acusação defende, ainda, que o caderno de encargos englobou a obrigatoriedade de os concorrentes apresentarem uma garantia bancária no concurso. O MP entende que essa medida servia para dificultar a vida aos eventuais concorrentes, que não a ValD’Ensino: tese que Marques e Reinaldo Veloso rejeitaram, lembrando que a obrigatoriedade da garantia resulta da lei.
Os defensores negaram que o facto de Rui Silva ter avalizado a garantia bancária de 500 mil euros dada pela Caixa Agrícola à ValD’Ensino, fosse um favor com gosto de contrapartida ilegal, acentuando que foi o gestor do banco que lhe pediu, e que Silva costumava dar avales aos mais variados negócios, sem que disso tirasse qualquer vantagem.
RUI SILVA NA EPATV
Sobre o facto de Rui Silva ter ido trabalhar para a EPATV após a sua saída da vereação, Reinaldo Veloso Martins acentuou que isso era natural dado que Silva é professor no ensino público, e garantiu que, ao contrário do que diz a acusação, exerceu funções e trabalhou para a Escola.
Sobre um carro que o ex-vereador vendeu à EPATV, o advogado salientou que ficou provado que o recomprou quando saiu, tendo perdido dinheiro na transação.
OS CRIMES
Recorde-se que Vilela foi julgado pelos crimes de corrupção passiva, prevaricação e participação económica em negócio, por causa da venda, em 2012, de 51 por cento da Escola Profissional Amar Terra Verde (EPATV).
Rui Silva, que não prestou declarações, estava (acusado de corrupção passiva e prevaricação) e o dono gestor da EPATV, João Luís Nogueira por corrupção ativa e participação económica em negócio)
Em julgamento, Vilela negou com veemência a prática de qualquer crime, tendo explicado que a Câmara passou por dificuldades de tesouraria tendo mesmo chegado a entrar num processo de “saneamento financeiro”.
Por isso, quando se fez a privatização – anotou – existia uma dívida, que a Escola dizia ser de 1,5 milhões de euros, já que contabilizava o valor das prestações atrasadas e os respetivos juros, por ela pagas em substituição do Município: “fizemos um acordo e esse montante desceu mais de meio milhão. Foi um bom negócio”, declarou Vilela.
Instado pela magistrada do Ministério Público a explicar vários mapas e operações contabilísticas relacionadas com a dívida, António Vilela vincou que a Câmara, bem como as de Amares e de Terras de Bouro, pagaram as dívidas à EPATV, mas ficaram na posse dos dois edifícios. Ou seja, “não houve qualquer favorecimento” à Escola.
ACUSAÇÃO
A acusação considera que os dois autarcas fizeram um concurso público pensado para beneficiar a empresa Val D’Ensino, propriedade de Nogueira.
Refere, ainda, que, após o concurso, a Escola pediu o pagamento de dívidas anteriores. Amares pagou, Terras de Bouro, também, e Vila Verde deixou o processo ir para o Tribunal Administrativo.
Já o ex-edil contrapõe que a privatização de 51 por cento da Escola Profissional Amar Terra Verde (EPATV) beneficiou os seus três sócios, os municípios de Vila Verde, Amares e Terras de Bouro, que não voltaram a “meter um cêntimo” na Escola depois de privatizada e ainda ficaram com os edifícios de Vila Verde e de Amares.