A Imagem Peregrina foi recebida com entusiasmo na Igreja de Nossa Senhora de Fátima no dia 6 de dezembro, havendo vigílias com inúmeros fiéis. A noite deste dia 7 foi memorável ao ponto de um cronista de um jornal de Lisboa escrever: «a maior, a mais bela, a mais assombrosa procissão que jamais se viu em Portugal…»
De facto, os relatos são extraordinários desde a saída da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, percorrendo, à noite, a partir das 21h e 30m, cerca de cinco quilómetros até à grandiosa Catedral de Lisboa, sendo estabelecido que só homens fariam parte desse desfile tão imponente na qual se incorporaram mais de 60 mil, mas se avaliarmos a multidão imensa que cercava as ruas da cidade podiam contar-se, à volta, de 500.000 pessoas.
As entidades públicas e privadas fizeram-se representar em grande número, nomeadamente com um grupo de Clarins de Cavalaria 2 e logo a seguir a charanga do regimento de Cavalaria 7 que abriam o cortejo, “seguiu-se a Mocidade Portuguesa, alunos da Casa Pia e das Escola da Marinha, do exército, do Colégio Militar e pupilos, soldados de todas as unidades militares da guarnição de Lisboa, Legião Portuguesa, Oficinas de S. José, filas de polícias sinaleiros com os seus capacetes brancos…e os milhares de homens com terços e velas na mão” a cantar, a rezar com uma devoção nunca vista. A nível da hierarquia da Igreja incorporaram-se na procissão prelados de vários locais do país, precedidos do Cabido da Sé de Lisboa, presidindo a este extraordinário ato Sua Eminência o Senhor Cardeal Patriarca.
Várias individualidades portuguesas e estrangeiras, destacando-se o Rei Humberto de Itália, Subsecretários da Guerra e das Obras Públicas, Governador Militar de Lisboa e tantos outros também quiseram prestar a sua homenagem à Mãe de Fátima.
Foi assim que o andor com a Imagem Peregrina seguiu, ao longo de vários quilómetros, no meio de uma multidão fervorosa espalhada pelas ruas, praças, largos, além dos milhares de homens que acompanhavam a aparatosa e imponente procissão nunca vista nas ruas das nossas cidades ou vilas. Que harmonia e beleza naquela noite tão iluminada com as velas, lanternas e, sobretudo, com o brilho daqueles tão brilhantes olhares, irradiando o fervor e a fé dos seus corações que fervilhavam com o seu amor e carinho para com a Virgem de Fátima! Dificilmente, se encontravam varandas, terraços às escuras e desprovidas de gente, donde eram lançadas “chuvas de pétalas” que não paravam de sobrevoar, dando um lindo florido a todo aquele percurso que alguém chamou a “procissão da multidão”.
A Catedral toda iluminada recebeu a Imagem, por volta da uma da manhã com os sinos a ribombar jubilosamente, os clarins a tocarem em sinal de continência e, finalmente, com Nossa Senhora de Fátima voltada para aquela massa de gente, como que num ato de agradecimento, cantou-se o Hino Nacional em homenagem à Rainha de Portugal, entrando para o Seu trono reservado, envolto em flores e de velas “palpitantes de luz”, sendo, até ao amanhecer, venerada por milhares de almas crentes.
Outro ponto alto desta jornada mariana teve lugar no dia seguinte, 8 de Dezembro de 1946, 300 anos em que Nossa Senhora foi proclamada, pelo Rei Restaurador, D. João IV, em 1646, Rainha e Padroeira de Portugal, invocada como Conceição Imaculada que só a nossa Mãe de Deus tem esse privilégio e que o Rei jurou defender.
Logo na manhã desse dia, o Cardeal Patriarca de Lisboa, o representante do Núncio Apostólico de Sua Santidade, o Ministro da Guerra e tantas outras individualidades assistiram a um solene pontificado. Da parte de tarde com a presença do Presidente da República, Óscar Carmona, membros do Governo e do Corpo Diplomático, todos os prelados do Continente e das Ilhas assistiram ao Te Deum presidido pelo Cardeal Patriarca que, perante o Santíssimo Sacramento exposto e da Imagem de Nossa Senhora de Fátima, renovou a consagração de Portugal a Nossa Senhora da Conceição, terminando com uma alocução vibrante, lembrando os feitos e a grandeza do ato histórico que jamais será esquecido.
As cerimónias na Sé Catedral terminaram com a Bênção, dando-se início à procissão em direção ao Terreiro do Paço para, em seguida, atravessar o Tejo na fragata “Diamantino I”.
Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História; direção artística de Luís Reis Santos, historiador de arte e diretor do Museu Machado de Castro, Coimbra…