Texto: Salvador de Sousa
O “Império” foi o barco que transportou a Imagem Peregrina para Angola, com partida no dia 20 de julho de 1948, visitando, no seu percurso, Funchal e S. Tomé e Príncipe. Nesta antiga colónia portuguesa, Nossa Senhora teve, como em todas as paragens e locais que visitou, honras da parte da população, das autoridades civis e militares que realçaram bem a semente que os portugueses lançaram nessas terras africanas e que souberam tão bem cultivar, deixando, nestas populações, um vínculo muito forte dos valores cristãos e de um amor sem limites à Mãe de Deus.
Dezenas de lanchas enfeitadas vieram ao encontro do paquete, seguindo-o, até ao local onde a Imagem desembarcou. O cortejo seguiu para a catedral acompanhado de um autêntico “formigueiro humano” solenizado com bandas de música, foguetes, cânticos e orações. Não podia deixar de passar, no caminho de regresso para o cais, pela Igreja da Conceição, vestígios marianos que os nossos antepassados espalharam pelo mundo.
O “Império”, às 24 horas, parte rumo a Angola, deixando para trás um rasto de lágrimas, de acenos e de gritos de despedida para, logo a seguir, fazer irradiar dos corações das gentes angolanas uma enorme jovialidade, uma ternura e uma fé inquebrantável. Dom Moisés Alves de Pinho, Prelado Metropolitano, rodeado das autoridades civis e militares, dos nativos e europeus, saudou a Senhora à entrada da cidade de Luanda, sendo o andor encaminhado para a Catedral no meio de cânticos de Fátima, orações fervorosas e tantos rostos a brotarem lágrimas de alegria, exteriorizando uma devoção profunda e tão maternal.
No dia 1 de agosto, o Prelado consagrou Angola ao Imaculado Coração de Maria, após uma celebração eucarística no Estádio da capital com o local ricamente enfeitado e onde ecoaram as mais sentidas saudações e entrega a Nossa Senhora de Fátima representada naquela Veneranda Imagem.
Grande parte das cidades, vilas e aldeias angolanas tiveram a dita de serem visitadas por tão desejado Ícone divinizado, sendo recebido com as mais nobres manifestações de carinho e de amor, passando por «Santo António de Musseques, nos subúrbios de Luanda, Cabinda, Santo António do Zaire, S. Salvador do Congo, Vila Salazar (N’Dalatando), Malanje, Cacuso, Porto Amboim, Gabela, Novo Redondo (Sumbe), Bailundo, Bimbe, Huambo, Caconda, Sá da Bandeira (Lobango), Huíla, Chibia, Jau, Humpata, Vila Pereira de Eça (Ondjiva), Moçâmedes, Porto Alexandre, Baía dos Tigres, Lobito, Catumbela, Benguela, Vila Nova, Silva Porto (Kuito), Chinguar, Andulo, Vouga(Cunhinga), Nova Sintra (Catabola), Vila General Machado (Camacupa), Cuemba, Teixeira de Sousa (Luau), Nova Chaves (Muconda), Vila Henrique de Carvalho (Saurimo), Dundo, Vila Luso (Luena) e Moxico.»
Segundo o nosso relator destas viagens, o Cónego Carlos de Azevedo, estas exteriorizações da população local tiveram sempre originalidades e maneiras tão variadas de manifestarem o seu afeto à Mãe do Céu:
Ao passar na ilha de Luanda, as mulheres indígenas cobrem o chão com os finos panos que adquiriram para dignificar o caminho por onde Nossa Senhora ia passar; em Novo Redondo, a guarda de honra foi feita por elementos vestidos com as camisolas do Sporting; é atribuído o nome de Nossa Senhora a uma Avenida de Nova Lisboa; em Bailundo, um machimbombo (autocarro) transportou a Imagem da Virgem de Fátima escoltado por tropa indígena, além de mais de 15.000 autóctones cristãos que receberam a Imagem Peregrina com archotes acesos, cantando e rezando. Assistiu-se, ainda, neste local, à inauguração de uma capela das irmãs de S. José de Cluny, tendo como Nossa Senhora sua patrona…
Por tantas localidades visitadas, tudo convergia e ninguém ficava em casa para louvar e bem-dizer a Virgem Mãe de Fátima. O próprio oceano ficava pejado de embarcações embandeiradas e floridas, como aconteceu em Moçâmedes, que acompanhavam, em “cortejo marítimo”, a lancha onde seguia o andor com a Imagem Peregrina. Na Baía dos Tigres, onde viviam cerca de 573 pessoas, só uma ficou em casa por se encontrar doente, mas o seu desejo era tal que foi obsequiada com a visita da Virgem.
Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História; direção artística de Luís Reis Santos…