Por Simão Mota Leite
CPCJ Vila Verde
À partida quem se encontra a ler este artigo teve com certeza uma infância diferente daquela que as crianças de hoje em dia têm. Frases como “no meu tempo era muito diferente” abundam as nossas conversas, nomeadamente no que se refere a tempos da nossa infância. Bicicletas, bolas, paus, pedras, piões, carrinhos, berlindes, muitos amigos e acima de tudo muitas horas a brincar na “rua”, ao ar livre! Com esse género de brincadeiras ganhamos imensas competências de socialização e destreza física também.
Os tempos mudam, hoje em dia o brincar na “rua”, no caso da grande maioria das crianças é impossível, porém continua ser extremamente necessário. Atualmente os nossos filhos e netos brincam sozinhos em frente a um ecrã qualquer, e muitas vezes também sem qualquer género de supervisão ou controlo do números de horas que se encontram “agarrados ao ecrã”.
Um recente estudo realizado em Inglaterra e País de Gales, refere que há crianças a entrar no 1º Ciclo (antiga escola primária) com fracas habilidades motoras básicas, sem rotinas de irem sozinhas ao W.C. (alguns ainda com fraldas), com sérias dificuldades em subir escadas, ou em realizar outras atividades motoras e a utilizar diversas expressões que não fazem parte da sua língua materna, tudo isto devido ao tempo excessivo passado online (inquérito realizado pela consultora Savanta para a instituição Kindred2, a mil professores em Inglaterra e País de Gales). Num outro estudo realizado pela investigadora portuguesa Rita Cordovil (Professora na Faculdade de motricidade Humana da Universidade de Lisboa), alerta que esta diminuição do tempo que as crianças passam a brincar fora de casa, nos anos críticos do desenvolvimento, contribui para um retrocesso das capacidades motoras, como por exemplo, tentar virar a página de um livro como se fosse um I-Pad, utilizar tesouras, pincéis, lápis, correr e coordenação motora no geral. Aponta também para uma diminuição nas capacidades sociais e emocionais, como por exemplo seguir instruções, esperar pela sua vez e partilhar e saber estar/funcionar em grupo. As capacidades cognitivas como resolução de problemas e criatividade também ficam aquém devido a essa falta de aprendizagem experiencial (brincar). Esta enorme falta de atividade física e contacto social deixa-nos indubitavelmente numa posição de regressão, pois situações como as supracitadas nos estudos, são enormes entraves a um normal desenvolvimento.
Nas etapas da primeira e segunda infância, as experiências sociais, as brincadeira físicas e simbólicas são fundamentais na formação de experiências, conceitos e capacidades para aprendermos a lidar com situações futuras.
Podemos então afirmar que as brincadeiras de/na rua são uma parte integral do desenvolvimento saudável das crianças, influenciando positivamente os aspetos físicos, cognitivos, sociais e emocionais de suas vidas. Proporcionar um ambiente seguro e estimulante para essas atividades é essencial para garantir que as nossas crianças cresçam de forma equilibrada e feliz. Nunca nos esqueçamos que a nossa função, como pais, avós educadores e sociedade em geral, é bem mais do que amparar as quedas, ou ajudá-los a levantarem-se, é sim deixá-los experienciar tudo que a infância tem para oferecer de forma a que no futuro eles o saibam fazer por si próprios, pois o percurso de vida de qualquer um de nós está cheio de quedas e recomeços. Portanto “esfolar os joelhos” é necessário, pois a infância é um chão que caminhamos a vida inteira!