Vimos na crónica anterior, que, da parte dos pais dos pastorinhos, tudo foi desenvolvido no sentido da procura da verdade. Agora vou falar do caráter, da personalidade destas crianças que foram as principais protagonistas daqueles tão divinais acontecimentos, tendo em conta a contemporaneidade dos autores da obra que partilho convosco. Investigaram, entrevistaram pessoas, colegas dos videntes, familiares, testemunhos oculares de tudo o que se passou na zona da Cova da Iria nos anos de 1916 e 1917.
A Jacinta era inteligente, muito ativa, graciosa e promotora de iniciativas próprias da sua fase etária; simples como eram as crianças do seu tempo. Por isso, nada de anormalidades psíquicas ou nervosas, nem sintomas de temperamentos visionários. Nos seus pequenos defeitos, mormente um pouco interesseira nos seus jogos, como também considero normal, porque quem entra num jogo é para tentar a vitória. Amiga de ajudar, sobretudo os pais no sustento do lar, sujeitando-se a tantos sacrifícios que a vida exigia. Sincera, devota, «amante profunda do Divino Prisioneiro do Sacrário.» Demonstrou, continuamente, uma angélica pureza nas suas afirmações a nível de tudo que ia presenciando e, perante tantas ameaças, inicialmente, da família, do clero, da autoridade civil, defendeu sempre a verdade com firmeza e convicção, estando pronta a dar a vida, fazendo com que, muitos desses intervenientes, começassem a acreditar.
O Francisco também muito dedicado à família, amigo de ajudar nas dificuldades, na doença da irmã, sincero, mas pouco expansivo. “Por ele nunca se teria sabido nada… fiel àquilo dos Livros Santos”: «É bom guardar o segredo de rei.». Mais um vidente que, por aquilo que se sabe dos seus conterrâneos do seu tempo, era “incapaz de mentir ou de urdir tal “tessitura” de factos como os das aparições de Fátima.”
A Irmã Maria da Conceição do Imaculado, Lúcia de Jesus, Religiosa Carmelita, a única sobrevivente, falecendo a 13 de fevereiro de 2005, com 97 anos, era uma criança, tal como seus primos, humilde, não possuía a instrução primária, sendo Nossa Senhora que lhe pediu para aprender a ler. Simples no trato, na maneira como se apresentava, verdadeira, alegre, de “memória fidelíssima, pronta e espontânea”, conversadora fluente como qualquer outra religiosa. Quando falava das aparições, fazia-o com modéstia, naturalidade e com grande segurança, olhar sereno, com voz pausada. Os factos eram revelados com lucidez, num discernimento e com uma fluidez admirável. Sempre entregue ao poder Divinal, dócil e obediente às suas superioras, seus diretores espirituais, a Sua Ex. cia e Reverendíssima, Bispo de Leiria, Dom José Alves Correia da Silva e para com os seus sucessores, procurando e acatando as suas opiniões mesmo que fossem contrárias à sua maneira de ser.
O que referi, são testemunhos, com opiniões unânimes, incluindo os que, sem qualquer tendência, a estudaram, como foi o caso do Padre H. Jongen que, durante muito tempo, conversou com a Irmã Lúcia, analisando o seu caráter e a sinceridade do seu testemunho sobre as Aparições de Fátima, publicando, em 1946, na revista Médiatrice et Reine, toda a verdade.
Não há prova maior do que do coração daquelas três crianças tão humildes, distantes dos grandes centros, habituadas apenas a lidar com a rudeza da serra se veem, de repente, apostas a tamanho desassossego, mesmo no seio familiar, com inquéritos, ameaças das autoridades, interrogatórios, inclusivamente do Reverendo Cónego Manuel Nunes Formigão, professor, na altura, no Seminário de Santarém que concluiu, apesar de uma ou outra discrepância em alguns pontos sem importância, no essencial, que as suas afirmações eram convergentes, longe de qualquer falsidade ou de qualquer pressão vinda fosse de onde fosse. «Os mais empedernidos, os mais rebeldes ficavam rendidos a tanta candura.»
Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História…